BAH!
Bazuca!
Babaca!
-"Ao vencido, ódio ou compaixão; ao vencedor, as batatas".
( Tem sentido.)
Tata Junq
*** Deixando aqui uma pesquisa,esclarecedora ... e convidando todos, às leituras Machadianas ...
Machado de Assis,Atemporal!!!! ***
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" Como eu tinha dito, teremos também alguns posts relacionando filosofia e literatura. Este é o primeiro deles. Para começar, nada melhor do que Machado de Assis, um dos autores brasileiros que mais refletiu filosoficamente por meio da literatura. Nesse sentido, creio que as Memórias Póstumas de Brás Cubas mostram o que ele tem de melhor a oferecer em relação à filosofia.
Encontramos muitas teses espalhadas por todos os cantos do livro. Aqui, em particular, irei expor o Humanitismo de Quincas Borba, personagem célebre de Machado. Essa filosofia está presente nas Memórias Póstumas, mas também no romance Quincas Borba. Quem já leu essas obras deve se lembrar desse personagem, que se apresenta primeiro como filósofo da miséria e depois como o detentor de uma verdade suprema, inigualável. Aqueles que não leram essas obras nem por isso precisam ignorar meu texto. Apesar de muito interessante, essa tese não caracteriza um spoiler do enredo. Pode-se conhecê-la e, depois, desfrutar das obras mencionadas.
A filosofia de Quincas Borba não é mera brincadeira de Machado, algo feito de qualquer modo. Ela é elaborada com certo rigor, o que atesta a genialidade desse autor. É uma tese filosófica séria, que parte de um princípio postulado e tira daí suas consequências, propondo a resolução de diversas questões da existência humana.
Em primeiro lugar, temos a postulação de um princípio universal, Humanitas. Esse seria o princípio criador de tudo, a origem do universo e sua inevitável destruição. Chama-se Humanitas porque “resume o universo, e o universo é o homem”. Humanitas é uma espécie de substância originária, como o Primeiro Motor Imóvel de Aristóteles. Ele tem uma fase estática, anterior à criação; uma fase expansiva, quando as coisas começam; dispersiva, quando o homem aparece; e contrativa, que é a absorção do homem e das coisas no princípio. É mais ou menos como se Humanitas criasse os seres expandindo a si mesmo (pois estes nada mais são que partículas do princípio), e depois, numa contração, fizesse com que os seres retornassem à sua origem. Cada ser corresponde a uma parte do corpo de Humanitas, o que justifica a existência de seres mais fortes ou mais fracos, pois “descender do peito ou dos rins de Humanitas, isto é, ser um forte, não é o mesmo que descender dos cabelos ou da ponta do nariz”.
Isso, diz Quincas Borba a um atônito Brás Cubas, destrói o caráter calamitoso com que encaramos a guerra. Já que a destruição não atinge o princípio universal, por ser uma das fases da substância, não há morte, mas apenas supressão de uma força para sobrevivência de outra. Isso torna a guerra benéfica. No exemplo clássico que Quincas Borba dá a Rubião em outra obra, podemos imaginar duas tribos famintas e um campo de batatas, campo este que só poderá alimentar uma das tribos. Caso dividam as batatas, as duas morrerão de fome. A guerra é, nesse caso, necessária e benéfica, pois a vida é o que há de mais sagrado para Humanitas. Nesse caso, Humanitas suprime Humanitas para permitir que Humanitas viva. Como resultado, temos o seguinte: “Ao derrotado, ódio ou compaixão. Ao vencedor, as batatas.” Ao vencedor, a vida merecidamente conquistada e suas delícias. Ao perdedor, ódio ou compaixão por ser o suprimido e não suprimir, por alimentar Humanitas e não fazer com que este seja alimentado.
Podemos ver que essa ideia decorre do princípio postulado. Pela natureza desse princípio, decorrem as explicações acima. Temos desse modo uma tese feita com rigor lógico. Qualquer sistema lógico começa com postulados (teses para as quais se pede aceitação) e daí tira-se as consequências, os teoremas etc. Obviamente, a saída para rejeitar essa filosofia é criticar o princípio postulado, dizendo que não temos motivo para supor que esse princípio realmente exista. Mas não devemos pensar que isso diminui a genialidade de Machado, pois, como eu disse, muitos sistemas lógicos e filosofias respeitáveis começam com tais postulados. Assim é a lógica aristotélica, assim é a ética de Espinoza, também como várias versões do argumento ontológico e, particularmente, muitas filosofias orientais. Sobre estas, uma comparação será útil.
O Humanitismo é muito semelhante ao Bramanismo, como o próprio Quincas Borba admite. Humanitas corresponde a Brahman, e podemos dizer que a conjunção das quatro fases de Humanitas pode ser comparado ao que o bramanismo chama de “respiração de Brahman”, ou seja, um ciclo completo de criação, expansão e retração. Temos também no Humanitismo a ideia, que eu ainda não havia explorado, de que a dor é uma ilusão, que nós só a sentimos por estarmos predispostos a isso. Isso é semelhante ao que o hinduísmo chama de Maya, a grande ilusão. Essa comparação merece destaque por um motivo simples: somente na segunda metade do século XX as filosofias orientais passaram a ser consideradas seriamente pelos círculos acadêmicos ocidentais. Antes disso, elas eram vistas como produto de um povo ilógico e não-científico, o que de modo algum é verdade. Temos apenas uma diferença de paradigma entre ocidente e oriente. De qualquer modo, podemos ver por aí novamente o mérito de Machado, que antecipa um movimento acadêmico em algumas décadas, ao fazer uso da filosofia oriental, interpretando-a de maneira refinada e elegante em sua obra.
O objetivo desse texto era apresentar o Humanitismo de Quincas Borba. Embora eu tenha defendido que essa tese é escrita com certo rigor, não quero de modo algum defender que ela seja verdadeira, nem que Machado de Assis tenha pensado isso. Muito mais provável é que essa tese seja exemplo do famoso ceticismo do autor, uma defesa de que uma eticidade real não é possível nesse mundo. Uma espécie de ironização da busca pela verdade última, que pode levar quem busca a assumir que a guerra é boa, e que a morte não existe. O que você acha, leitor? E sobre a exposição da teoria? Espero que você tenha gostado. Não deixe de comentar. Machado merece."
João Víctor é estudante de filosofia da UNB que ocupa seu tempo livre tentanto descobrir a Pergunta Fundamental (a Resposta, nós já temos). Da filosofia e de seus livros, adquiriu problemas de visão, nenhuma perspectiva de um futuro financeiro promissor e muitas dúvidas. Ah, sim, filosofia é muita viagem. Muita… Mesmo.
Texto postado pelo administrador do site: Gustavo Magnani / 23/4/2012 )