quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Projeto Luz às Ignorâncias: Baudelaire & Projeto Alma Feminina.







[POESIA] UMA CARNIÇA – CHARLES BAUDELAIRE


Lembra-te, amor, do que nessa manhã tão bela,
Vimos à volta de uma estrada?
- Uma horrenda carniça, oh que visão aquela!
Aos pedregulhos atirada; 

Com as pernas para o ar, qual mulher impudente
Tressuando vícios e paixões
Abria de maneira afrontosa e indolente
O ventre todo exalações;
Radiante, cozinhava o sol essa impureza,
A fim de tendo o ponto dado,
Cem vezes restituir à grande natureza
Quando ela havia ali juntado.
E contemplava o céu a carcaça ostentosa,
Como uma flor a se entreabrir!
E o fétido era tal que estiveste, nauseosa,
Quase em desmaios a cair.
Zumbiam moscas mil sobre esse ventre podre
De onde os exames vinham, grossos,
De larvas, a escorrer como azeite de um odre.
Ao longo de tantos destroços.
E tudo isso descia e subia em veemência
ou se lançava a fervilhar…
Dir-se-ia que esse corpo a uma vaga influência
Vivia a se multiplicar!
– Era um mondo a vibrar sons de música estranha,
Bem como o vento e a água em carreira
Ou o som que faz o grão que o joeirador apanha
E agita e roda na joeira,
E tudo a se apagar mais que um sonho não era,
- Esboço lento a aparecer
Sobre a tela esquecida, e que um artista espera
Só, de memória, refazer.
De uns rochedos, por trás, uma cadela quieta,
com desgostoso olhar nos via
espiando a ocasião de retomar, à infecta
ossada, o que deixado havia,
– E no entanto hás de ser igual a essa imundícia,
A essa horripilante infecção,
Astro dos olhos meus, céu da minha delícia.
Tu, meu anjo e minha paixão!
Assim tu hás de ser, oh rainha das Graças!
Quando depois da extrema-unção
Fores apodrecer sob a erva e as flores baças,
Entre as ossadas, pelo chão!
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Diz então, lindo amor, à larva libertina.
Que há de beijar-te em lentos gostos,
Que eu a forma guarde, mais a essência divina,
Dos meus amores decompostos!
Trad.:Álvaro Reis

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Num dia ... ouvi parte desses versos ...em outro,no registro de um torpedo ...
Um dia serei um amor decomposto ... em cinzas.
(Espero.)
Quanto às larvas"libertinas"... talvez beijem-me em pensamentos,e corroerão meu ser ...
Sem mortes ...
Vivo a lembrar-te.
Que será de ti?
Que há de mim?
Saudade é como verme-faminto ... faz estragos ...quando a falta de,toma os pulsos, e faz direção,buscando momentos.
Saudade agora, é verme!
Come-me,devagar ...
E tem formas,um corpo,uma alma que não pude tocar ...
Bem quis te amar ... bem quis ... e, amei-te a cada palavra,a cada olhar,a cada toque.
Nos solitários pensamentos ... dedilho as teclas,qual acordes de um violão ... formo palavras,que me despem ... E infinda dor,cobre-me.
Assim o é.
Agora, ao relembrar poesia,essência-criativa , do admirável Baudelaire ... ressuscitei a tua imagem.
Beijo-a como foto antiga e sorrio em dor.
Dor da saudade.
Dor por tua boca muda ... que poderia muito bem estar beijando a minha.
Assim o é!

Tata Junq

( Uma Alma Feminina.)


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